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Tag: musica

Natalie Merchant – Motherland. [download: mp3]

Natalie Merchant - MotherlandA cantora e compositora, ex-vocalista da cultuada banda 10,000 Maniacs, teve excelente recepção da crítica e do público com o lançamento do seu terceiro disco solo, entitulado Motherland. Toda essa celebração é realmente justa, já que neste álbum Natalie mostra impressionante destreza ao percorrer diversos ritmos em um mesmo trabalho, todos exalanda uma sonoridade muito particular e letras que são pura poesia. “This house is on Fire” abre o disco com o impacto de uma mistura que poderia soar leviana, não fosse a habilidade de composição da artista ao embalar, em uma mesma canção, o ritmo do reggae com uma orquestração com sublime inspiração arábica, tudo ligado por uma bateria de ritmo forte e declarado. Não bastasse a beleza dessão união melódica incomum, a letra da canção também causa arrepios, já que seus versos quase messiânicos tecem duras críticas ao comportamento belicista e irascível que impera em certas partes do mundo, e declaram, em tom profético – apesar de Natalie negar sê-lo nas letras -, que os resultados disso serão catastróficos. Por coincidência, ou pura clarividência da artista, os eventos do 11 de setembro tomaram lugar dois dias depois do lançamento do disco. A faixa seguinte, “Motherland”, que apresenta uma suavíssima sonoridade country, evidencia os reveses do comportamento humano contemporâneo, clamando por um retorno à vida mais natural e pacífica, o que acaba funcionando como uma segunda parte da canção anterior, em tom mais ingênuo e menos revoltoso. Em sua primeira escuta, “Saint Judas”, com sua forte melodia blues, já conquista o ouvinte, que se sente impelido a cantar junto com Natalie e acompanhar a beleza gospel da cantora Mavis Staples. Sua letra retrata a crueldade dos ataques à negros na época do segregamento racial americano – um soco no estômago. “Put The Law On You”, cujas letras revelam a decepção de alguém que ama frente as traições de seu companheiro, é melodicamente desesperada no seu derramamento romântico, com excepcional uso de orgão e saxofones. É também no blues/rock que a melancólica faixa “Build A Levee” se constrói, ainda com backing vocals da cantora gospel, e em cujas belos versos canta-se os perigos que as mulheres encontrarão nos homens – a sedução, a mentira, o abandono. Em uma melodia esplêndida, que apresenta um luminoso crescendo, enquanto a voz de Natalie permanece suave e afetuosa, “Golden Boy” é considerada uma das melhores composições da artista, trazendo versos espetaculares que usam o massacre da escola americana Columbine como mote para tecer uma crítica à maneira como se constroem os ídolos modernos. Também em arranjo idílico, de clima cinematograficamente fantasioso e fabular, “Henry Darger” tem letras que citam as criações de uma das figuras mais idiossincráticas que já se teve conhecimento – Darger foi o criador de uma estória de mais de 17.000 mil páginas, pinturas e desenhos de um mundo de heróis e aventuras infanto-juvenis, morrendo sem nunca ter obtido conhecimento do grande público. Em “The Worst Thing”, Natalie Merchant apresenta uma melancólica e doce sonoridade espanhola, tudo apoiando o sentimento de perda e dor dos versos que procuram alertar sobre a ilusão da felicidade que a paixão traz, tão somente para tornar a queda ainda maior quando esse ilusão se desfizer – é uma canção sublime. O álbum termina com o blues de “I’m Not Gonna Beg”, cuja melancolia sonora que Natalie arquitetou se repete nas letras que demonstram alguem que foi rejeitado por quem amava, mas que ainda tenta deixar esta relação demonstrando orgulho e amor próprio – só esta canção já valeria o disco inteiro. Baixe essa demonstração de versatilidade musical pelos links baixo.

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Camille – Le fil. [download: mp3]

Camille - Le FilCamille é conhecida na França simplesmente assim, pelo seu primeiro nome, sem o uso do sobrenome, Dalmais. E Camille é, definitivamente, a coisa mais contemporaneamente bem sucedida que a França já conseguiu lançar, cantando em sua língua materna. As comparações com a islandesa Björk são frequentes, mas isso ocorre tão somente devido a semelhança de Le fil, segundo álbum de Camille, com Medúlla, o último álbum de Björk: ambos utilizam de maneira forte sons produzidos pelo própria voz de suas intérpretes/compositoras como o principal artifício sonoro das canções. E, diferentemente do álbum da cantora islandesa, considerado difícil e, para alguns, quase “inescutável”, Le fil é um espetáculo delicioso para os ouvidos. Camille sabe ser pop, jazzística, pós-moderna, lúdica e, como não poderia deixar de ser, francofonicamente elegante. O grande achado da garota é revelado pelo título do disco: “le fil”, significa “o fio”, e ele é representado sonoramente no disco por um murmúrio, um cantar monocórdico que percorre e liga todas as músicas, do início ao fim do álbum. Ele não é sempre audível, a maior parte das vezes é recoberto pela melodia das músicas, mas está lá presente, e é notado sempre que há um silêncio dentro da harmonia da música. Isso acaba por criar uma unidade sonora entre todas as canções, mas ao contrário do que se possa pensar, não as torna absolutamente iguais. Há espaço para tudo no mundo de Camille. E tudo feito quase que esclusivamente pela sua voz. O disco abre com “La jeune fille aux cheveux blancs”, que, claro, começa com o ponto de partida do “fio” sonoro e, em alguns instantes, é invadido pela voz esplendorosa da cantora, que entoa os versos da música, enquanto, ao fundo, ela é invadida por uma variedade enorme de diferentes coros repetidos de sua voz, fazendo o acompanhamento como breves “estacatos”, bateria ou violão vocais. Depois de sermos tomados pelo lirismo dessa música, somos supreendidos pelo tom absolutamente lúdico e vivaz de “Ta Douleur”, onde Camille não se nega a fazer os sons mais estranhos possíveis com a boca para servir de fundo aos versos animados da canção, que revela o uso de um trompete apressado lá pelo meio da melodia. “Assisse”, a terceira faixa, traz um cantar menos diferenciado em tons, sintetizado em várias vozes que cantam a mesma melodia. Contudo, como Camille mostra nesse disco nunca deixar de ser uma surpresa maravilhosa, perceba que os “acordes” de voz que fazem a breve introdução da canção imitam uma guitarra. E, para nosso prazer, não somos poupados nem de uma repentina limpeza que Camille faz na sua garganta – sim, aquele “hãn hãn” eternizado pelas pastilhas Vick. Pós-moderno como é, o disco também não deixa de apresentar uma mesma canção dividida em três diferentes partes, com três diferentes andamentos e variações no verso e melodia. “Janine I” é uma canção simples, cantada com pressa pela francesa, com uma batida cíclica, produzida por sua voz- claro – ao fundo; “Janine II” tem andamento muito mais lento e preguiçoso, revelando um baixo quase apático como acompanhamento; “Janine III” é a mais ligeira, e traz os versos cantados numa velocidade difícil se acompanhar, junto com um trompete igualmente delirante – e, aos poucos, mostra um acorde que vai fechar a canção, simulando um distanciamento quase sideral da melodia, ou som de um carro de corrida se afastando, se preferir – muitíssimo divertida. “Vertige” traz um coro no fundo que simula algo que pode ser interpretado como gostas de chuva em um pedaço de lata, ou, quem sabe um relógio; tudo emoldurando a breve melodia principal. “Senza” transpira beleza em sua melodia que incita algo bem primaveril, um belo dia de céu azul limpo e sol radiante, com aqueles breves lampejos de melancolia que esses dias lindos costumam revelar – ao menos eu sinto isso com frequência. “Au port” apresenta um batida rápida, produzida em uma caixa ou coisa semelhante, adornando a harmonia lindíssimamente altiva da voz de Camille, acompanhada por um teclado que encorpora um som metálico e um trompete, ambos sempre discretos ou pontuais. “Rue de Ménilmontant”, penúltima faixa do álbum, tem a beleza tranquila de uma balada algo triste. Mas a balada mais bonita do disco é mesmo “Pour que l’amour me quitte”, que mostra uma Camille mais despreocupada em ser contemporânea, cantando simplesmente e deixando-se acompanhar pelo som de um baixo (ou um teclado?) cintilante e cíclico. Em “Baby Carni Bird”, somos apresentados à uma Camille mais jazzística, cantando alguns versos em inglês inclusive, e mostrando que não há nenhuma obrigação em um pop-jazz ser pausteurizado ao ponto de parecer sempre qualquer coisa feita por Norah Jones. Contudo, a faixa mais retumbante é “Pâle Septembre” – veja vídeo ao vivo aqui no blog. Nesta música somos introduzidos em um cantar sofrido e uma melodia silenciosa, pontuada ao fundo por breves acordes de um teclado. Logo, surgem os belos corais de fundo de Camille, simbolo maior do disco, para sermos apresentados à versos em inglês cantados em harmonia quase silenciosa. Tudo isso prepara o ouvinte para ser surpreendido com a beleza explosiva que surge à seguir, em uma sequência melódica que revela uma Camille lírica e profusa como nunca, com direito à uma orgia de todos os instrumentos musicais usados até então discretamente no disco. É como se estivéssimos submersos por um longo período em um oceano, ou vagando no espaço, e fóssemos arremesados repentinamente em uma floresta repleta de sons de sua fauna e flora – a sensação é inesquecível, e a música entrou de imediato, desde sua primeira audição, na minha lista concorridíssima de “músicas para se ouvir ao se jogar do topo de um arranha-céu”. Não bastasse isso, ainda temos a maravilhosa última faixa do disco: “Quand je marche” é tranquila e romântica, deliciosa de se ouvir seguidamente. E o disco fecha com o “fio” sonoro sendo acompanhado de frases de Camille gravadas, aparentemente, fora de um estúdio – já que o álbum é mesmo uma bela ode ao dom humano do falar, nada melhor deixa-lo soar naturalmente ao seu fim. Baixe agora esse disco esplendoroso através dos links a seguir.

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Gotan Project – Lunático. [download: mp3]

GotanDepois do sucesso de La Revancha del Tango, o Gotan Project – também conhecido como Jectpro Tango – retorna com o álbum Lunático. A música engendrada pelo trio europeu-americano prossegue insinuante, sensual, sedutora, hipnótica, delirante e poderosa, mas agora também ganha tonalidades acústicas sutis. Não resta dúvidas que o destaque absoluto do álbum é o single “Diferente”, que cativa imediatamente o ouvinte com sua melodia tecno-tango dançante, saborosa e irresistível: impossível passar por essa mistura magistral de beats, samplers, contrabaixo, acordeão e tecituras orquestrais sem voltar o player para ouví-la uma vez mais. De atmosfera menos romântica, “La Vigüela” também fascina, com seus versos recitados em dueto parte robotizado e sua harmonia assumidamente eletrônica, ainda que adornada pelo fogo do ritmo genuinamente argentino. “Arrabal” delicia os ouvidos com o vocal encantadoramente preciso de Cristina Vilallonga com a melodia da canção, recheada de violões e acordeão que duelam entre si, sobre a batida eletrônica suave ao fundo. A destreza musical do Gotan Project é tanta, que até vocais embebidos na fonte do gênero rap conseguem angariar a simpatia e apreciação do ouvinte na faixa “Mi Confesion”. Isso porque, obviamente, o subtexto aqui é o tango pós-moderno do trio, e as letras são poéticas e delicadas, diferentemente daquela coisa irascível e “inescutável” do gênero. As faixas que se apresentam mais instrumentais também tem seu lugar no novo álbum, como na orquestração soberbamente luminosa que enfeita “Criminal” e a recriação, que suaviza o sorumbatismo mas intensifica o drama de “Paris, Texas”, tema clássico da obra-prima de Win Wenders composto por Ry Cooder. “Lunático”, faixa-título do disco, com seu acordeon de tons breves, quase sem fôlego, remete à brevidade das corridas de cavalo – não por um acaso, já que seu nome foi herdado do cavalo de corrida que Carlos Gardel possuía. Contudo, a grande surpresa do segundo trabalho do Gotan Project são as faixas quase ou totalmente despidas de eletronismos. “Amore Porteño” prossegue melodicamente em uma toada desesperançada e trágica, o que coincide com o teor de seus versos. “Celos” segue na mesma toada, mas apropria-se ainda mais de um teor jazz/cabaré, denotado mais visivelmente pelos ruídos captados ao vivo.
Soberbo, o disco é uma belíssima fusão de tradição e contemporanismo, onde o dramatismo e a paixão tipicamente latinos ganham tonalidades ainda mais impactantes ao serem adornados pela sonoridade de samplers e demais manipulações eletrônicas. Merece lugar na coleção de CDs sem pestanejar. Baixe o disco por um dos links abaixo.

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Death Cab for Cutie – Plans. [download: mp3]

Death Cab for Cutie - PlansO mundo da chamada música “independente” está repleto de bandas com uma sonoridade semelhante, algo que as identifica de forma imediata ao ouvinte por lhe sugerir uma sonoridade mais reflexiva, bem como suas letras, verdadeiramente poéticas. A banda americana Death Cab for Cutie é considerada um dos maiores expoentes desta vertente do gênero rock.
Plans, álbum de 2005, é o primeiro lançado por uma grande gravadora, a Atlantic Records, uma das subsidiárias do grupo Warner. Os fãs, ao descobrirem a assinatura do contrato com um gigante da indústria da música, temeram que a banda sofresse alterações na produção de sua obra musical. O medo não se justificou, já que Plans mantém a identidade da banda e qualidade de sua música.
O álbum inicia-se com a sutileza que é marca da banda: teclados, bateria, baixos e guitarra trabalham juntos como vocal de Ben Gibbard para dar suporte às letras inspiradíssimas de “Marching Bands of Manhattan”, onde cenários da metrópole mais famosa do mundo servem de fundo para belos versos românticos. “Soul Meets Body” tem uso espetacular de violões e uma poética delicada e muito bem construída em suas letras, que cantam sobre o poder de uma paixão que intensifica os sentidos. “Summer Skin” reflete, com beleza e serenidade, sobre um amor que teve a intensidade e longevidade de uma estação do ano. Em “Different Names for the Same Thing”, acompanhamos um viajante com um sentimento de deslocamento e perda de identidade tão grandes que já nem mais importa qual será sua próxima parada. As inevitabilidades da vida também são tematizadas em canções do álbum: “I Will Follow You into the Dark” mostra a intensidade do amor que sobrevive mesmo depois da morte de quem se ama; “Stable Song” aborda a resignação de alguém que envelhece e sente a proximidade do encerramento. Como não poderia deixar de ser, já que estamos falando de Death Cab for Cutie, ambas as canções tratam destes temas com suavidade e encantamento, tanto nas letras irretocáveis quanto nas melodias silenciosas que trazem ao ouvinte. A faixa “What Sarah Said”, que tem melodia um pouco mais intensa e um piano emotivo, também tematiza as adversidades, mas de maneira diferente, retratando personagens em uma sala de espera de hospital, aguardando as notícias de alguém que não está tendo um destino feliz no interior de uma UTI. As amarguras do viver parecem ser mesmo singularidades temáticas da banda: com melodia dramática, porém enxuta, temos em “Someday You Will Be Loved” a representação da eterna ilusão de que todos encontrarão sua alma gêmea. Não resta dúvidas de que a banda sabe ser impiedosamente tocante.
Contrastando com as bandas mais populares do cenário rock, como o adorado U2, bandas alternativo/indies como o Death Cab for Cutie conseguem obter o mesmo efeito de arrebatamento sonoro com melodias mais contidas e econômicas, porém sem nunca perder a profundidade emotiva. As letras das composições também conseguem, muitas vezes, mostrar-se ainda mais repletas de beleza e poesia do que aquelas compostas pelos grandes nomes da música mundial. É uma pena que tais bandas sejam promovidas de forma tão limitada, já que, costumeiramente, são lançadas por pequenos selos. No entanto, para nossa felicidade, a internet está aí para trazer ao conhecimento de quem quiser algo além do que normalmente obtemos nas lojas de discos. Link para download abaixo.

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Jorge Drexler – Eco 2. [download: mp3]

Jorge Drexler - Eco 2O Uruguaio Jorge Drexler foi revelado para os meios de comunicação de forma repentina através da indicação, e subsequente vitória, de sua composição, para o filme “Diários de Motocicleta”, para o Oscar de Melhor Canção. Quem é inteligente sabe aproveitar as oportunidades e reduzir um pouco mais a sua ignorância cultural. Visto que meus conhecimentos de música latina são irrisórios – e, por favor, não estou falando de Shakira -, aproveitei a ocasião para chafurdar a internet em busca de seu disco mais recente, e o maior responsável pela sua popularização, Eco/Eco 2.
Drexler mostrou-se, neste álbum, uma grata surpresa. Textos da internet comparam seu trabalho ao de Caetano Veloso, chamando a atenção para o uso de sutis ruídos eletrônicos. É certo que sua semelhança com o que de melhor há na MPB contemporânea salta aos ouvidos de qualquer brasileiro, mas a similiradede com a obra do mais famoso compositor baiano não é exatamente correspondente. A música de Drexler tem muito mais a ver com a poética sutil e o encantamento melódico de Adrina Calcanhotto e, em menor grau, com os últimos trabalhos de Marisa Monte. As composições do uruguaio transpiram delicadaza, classe, elegância e suavidade, tanto em seu caráter harmônico quanto lírico. A inspiração na sonoridade brasileira contemporânea fica bastante clara em “Don de Fluir”, com suave batida eletrônica e cadência deliciosa e elegante, na irresistível “Transporte”, com estupenda combinação de violões e bases eletrônicas, e na percussão macia e bem trabalhada dos versos doces de “El Monte y El Rio”. Porém, a qualidade da musicalidade de Jorge Drexler também revela-se nas sua composições de raízes mais românticas, como na reverberação algo cíclica da bela faixa-título, “Eco”, na harmonia que funde o melhor do pop com bases orquestradas e que adorna os versos de sincera sensiblidade de “Deseo”, e na linda melodia compassiva de “Todo se Transfoma”. A destreza do artista é tanta que ele conseguiu reservar espaços até para arroubos sonoros, com uso perfeito de instrumentação erudita em “Se Va, Se Va, Se Fue”, e também para demonstrar a sua habilidade como letrista nos versos de “Guitarra y Voz”, que guarda impressionante parantesco com as composições mais poéticas de Adriana Calcanhotto e Arnaldo Antunes e também no electro-contemporanismo explícito de “Oda al Tomate”. A latinidade, claro, está presente em todas as faixas, mas é sempre algo exposto de forma tranquila e plácida, como em “Milonga Del Moro Judio” e na música ganhadora do Oscar, “Al Otro Lado Del Río”, realmente uma das poucas merecedoras da premiação, com sua letra e melodia melancólicas, ainda que perseverantes. É ouvindo todo o disco que nota-se que Drexler não força jamais sua voz, entoando suas canções com um cantar suave, calmo e aveludado, poucas vezes levantando mais sua voz, como no refrão de “Polvo De Estrellas”, música que reúne de forma sublime todos os predicados do artista: música, melodia, poesia e raízes culturais.
Sem dúvidas Jorge Drexler é daqueles poucos artistas dos quais nos orgulhamos de ter em nosso país: se sentimos imenso prazer na brasilidade pós-moderna e literária da música de Adriana Calcanhotto e na elegância popular de algumas facetas de Marisa Monte, assim deve ser com Drexler no Uruguai, ainda mais agora, depois de conquistar um dos prêmios mais cobiçados do mundo, graças ao seu convite para deixar seu registro no filme do brasileiro Walter Salles. Depois de tanto tempo sem mostrar qualquer interesse pelos novos artistas da chamada nova MPB, só me restou mesmo ampliar minha busca além de nossas fronteiras culturais e linguísticas. Ainda bem que, geralmente, consigo superar certos preconceitos e me dar ao prazer de arriscar novas experiênciais musicais. Não fosse isso estaria ainda tentando entender o que há de tão bom em Max de Castro e Luciana Mello – deus me perdoe. Baixe o álbum utilizando os links que seguem depois da lista de faixas e use a senha para descompactar os arquivos.

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Muse – Black Holes and Revelations (+ 1 faixa bônus). [download: mp3]

Muse - Black Holes & RevelationsCom a liberação na internet do primeiro single do aguardadíssimo novo disco da banda britânica Muse, um verdadeiro furor discursivo tomou de assalto as comunidades dedicadas ao trio. A sonoridade de “Supermassive Black Hole” assustou os fãs mais ferrenhos, angariando o ódio destes e a simpatia dos mais despreocupados. No entanto, a suspeita de ambas as “facções” que rapidamente se formaram era quase idêntica: o novo disco da banda mostraria um Muse bem diferente daquele adorado e conhecido pelos fãs.
Agora, depois de semanas de bate-boca e ofensas mútuas, o álbum vazou na internet – para variar – e as expectativas amainaram: há traços que diferenciam Black Holes & Revelations dos álbuns anteriores do Muse, mas nada que transforme radicalmente a identidade da banda.
Apoteótica a música da banda prossegue sendo, como podemos conferir na faixa de abertura, “Take a bow” e também em “Exo-Politics”, “Assassin” e “Soldier’s Poem”, todas faixas que assemelham-se pela mensagem política – algumas mais sutis e mais citacionais, outras mais explícitas – , que se abre universalmente contra o belicismo e a manipulação da opinião pública sem apresentar, contudo, qualquer tipo de pedantismo engajado – é Muse no seu melhor, com letras trabalhadas sem nunca esquecer que é, acima de tudo, música. Porém, os delírios de derramamento amoroso do trio britânico continuam firmes e fortes, como se pode ver no amor impossível de “Hoodoo” – balada espetacular, com a típica virada melódica da banda, à maneira da música erudita, com orquestração farta de pianos em apoteose e cordas épicas -, na dependência desmedida da bárbara “Map of the Problematique” – com sequências em que a bateria se faz deliciosamente preponderante – na emoção nada contida de “Invincible” – onde contribuem a bela introdução de teclado arranjado como um orgão e a bateria em tom marcial -, no embevecimento romântico de “Starlight” – de harmonia fulgurante, com teclados nostálgicos e bateria sincopada – e no amor nevrálgico de “City of Delusion” – com energizantes riffs de guitarra e o vocal intenso e delirante de Matthew Bellamy.
Apesar da identidade da banda fazer-se presente, ela se mostra-se intensamente mesclada com sonoridades que podem apresentar inspiração mais difusa em algumas faixas – como nos teclados da faixa de abertura, “Take a bow” – e bem mais clara a algo assumida em diversas outras. A música de identidade forte do The Mars Volta, por exemplo, pode ser reconhecida no sutil apeado latino dos acordes do violão, do ritmo da bateria e metais de “City of delusion”, na guitarra e baixo grave e profundo de “Hoodoo”, e na força que estes tem em “Knights of Cydonia”, com seu refrão de vocais sobrepostos. Além da referência à esta banda, de história mais recente no cenário musical, algo do pop contagiante do Depeche Mode do fim dos anos 80, do gostoso Europop que fez tanto sucesso à época, também é adotado em “Starlight”, música de melodia pop-rock fenomenalmente esfuziante e luminosa e, principalmente, na faixa “Map of the problematique” – com um arranjo perfeito no ritmo ensaiado e sincronizado entre bateria, guitarra, baixos, teclados e também no excelente uso que Matthew Bellamy faz de seu vocal.
Em tempos de copa do mundo, podemos conferir que a atitude de tecer críticas ao trabalho de quem idolatramos, tendo contato com uma fatia tão ínfima do trabalho que seria desenvolvido – já que todo o furor crítico inicou-se com apenas uma canção do novo disco do Muse e, no caso da seleção brasileira, tendo disputado apenas uma partida -, pode ser bastante imatura, uma vez que, na verdade, a crítica antecipou-se à apropriação daquilo que se objetiva analisar. Aqui estamos então, com um belo disco do trio britânico, vigoroso e com alguma sutil renovação, que acabou desmotivando todo o bate-boca insensato e, no futebol, nos preparando para a segunda disputa, amanhã, de nossa seleção. É esperar para que o resultado do desempenho dos atletas brasileiros seja tão inspirado, genuíno e animador como o do trabalho do Muse.

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Jerry Goldsmith – The Omen (1976). [download: mp3]

Jerry Goldsmith - The OmenJerry Goldsmith compôs a música de filmes que marcaram o cinema: criou, entre inúmeros outros filmes, as trilhas de “Jornada nas Estrelas”, “Alien”, “Poltergeist”, “Chinatown” e “Planeta dos macacos”. No entanto, é a sua trilha para o clássico “A Profecia”, de 1976, que fez história e definiu para sempre um paradigma para trilhas de filmes de horror. Quer provas? Quantos filmes de terror, sejam superproduções ou filmes assumidamente “B”, que se utilizam de coros em um cantar profundo e grave entoando melodias mórbidas? Dezenas, eu poderia afirmar. Porém, a fonte original da idéia foi do senhor Jerry Goldsmith, falecido em 2004.
Ninguém até hoje saberia dizer como Goldsmith teve a genial idéia de colocar um coro, de inspirações nitidamente sacras, cantando, em latim, versos de adoração ao demônio. Mas todos sabem admitir que o resultado de seu trabalho para o filme é nada menos que uma obra-prima irretocável. O deslumbramento ao ter contato com a profana música do filme é tamanho, que a academia do Oscar simplesmente ignorou a única música “normal” da trilha, “The Piper Dreams” – uma canção romântica e florida, bem ao estilo das músicas enfileiradas até hoje para o prêmio de “Melhor canção” – e indicou “Ave Satani”, o glorioso hino à Satanás que abre o disco e é a base de todos os outros temas musicais desenvolvidos no filme. A canção acabou não ganhando, mas ficou para a história como a indicação para melhor canção menos ortodoxa da academia até hoje. Porém, a justiça ainda foi feita na mesma cerimônia com a premiação, na categoria Melhor Trilha Sonora, para a trilha diabólica de Goldsmith.
A música do filme não é realmente para todos – se você se deixa levar por purismos religiosos ou se assusta com facilidade, não a ouça, ao menos não à noite. Quem não sofre com tabus do tipo pode aproveitar todo o esplendor da trilha. “Ave Satani”, a “prece” que é o tema principal do filme, é o coração deste trabalho de composição de Goldsmith, e introduz a atmosfera diabólica do álbum. Em versos que homenageiam o diabo, o coro surge em sua primeira participação, entoando um cantar diabólico e funesto com orquestração pomposa. Em “Killer’s Storm” o coro acompanha a melodia que se inicia de forma lenta, para repentinamente devassar a canção em uma virada delirante, com direito à violinos rascantes e metais que ampliam a ansiedade da melodia – e com conclusão não menos épica. “The Demise of Mrs. Baylock” já inicia sem poupar o ouvinte, em uma orgia infernal de coros, cordas, percussão, metais e todo um arranjo orquestral diversificado. É aqui que o coral criado para o filme demonstra toda a sua glória diabólica, abusando de seu poderio e explorando o suspense até com uma sequência de sussuros sibilantes – é de arrepiar. “The Fall” ludibria os ouvidos, já que ensaia levemente o tema romântico do filme, para logo suplantá-lo diante da força da sonoridade maléfica do coro. Já em “The Dog’s Attack” o coro começa de maneira algo tímida e pontual, com sutis momentos religiosos, e transpõe a harmonia para o fatalismo e suspense recorrentes na música do filme – com direito a pequenos acordes sinistros de piano. E em “The Altar”, música que que fecha o disco, temos uma variação melódica de “Ave Satani” que mistura temas desenvolidos por todas as canções da trilha para concluir o trabalho em tom vitorioso – e não exatamente celebrando a vitória do bem sobre o mal.
Porém, há espaço para harmonias mais tranquilas na trilha sonora de “A Profecia”. “The New Ambassador”, por exemplo, é o tema romântico do filme, com orquestração farta e bela, e que por vezes tem suas principais nuances introduzidas em meio as sonoridades sinistras preponderantes, como vemos em “A sad message” e “Don’t let him”. “The Pipers Dream”, a única canção com letras em inglês, é praticamente uma versão cantada de “The New Ambassador”, e apesar de ser apenas uma canção tradicional perdida em meio aos cantares infernais, tem bela melodia e letras.
Primorosa e definitiva, a trilha que Jerry Goldsmith criou é eternamente insuperável, deixando pelo caminho trilhas-irmãs que se utilizaram de seu achado, algumas até mesmo sucedendo em trabalhos bastante interessantes – como a trilha composta por Wojciech Kilar para o “Drácula” de Francis Ford Copolla, que antropofagicamente se utilizou da criação de Golsdmith para definir um estilo próprio. É por seu valor histórico e qualitativo incontestáveis que qualquer amante da sétima arte estaria vendendo a alma para o diabo – desculpem, não pude evitar o trocadilho – para colocar as mãos neste disco. E é em nome de todos estes que eu fiz questão de ripar meu próprio CD original da trilha de “A profecia” e colocar na internet. Não percam tempo e bom proveito!

1: http://rapidshare.de/files/22662274/the_omen_1976_jerry_goldsmith_1.zip.html

2: http://rapidshare.de/files/22663681/the_omen_1976_jerry_goldsmith_2.zip.html

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Michael Nyman – Prospero’s Books & Royal Philarmonic Collection. [download: mp3]

Michael Nyman - Prospero's Books e Royal Philarmonic CollectionHá dois diferentes grupos de compositores que trabalham concebendo trilhas sonoras. O primeiro deles é composto por músicos que arquitetam peças que servem tão somente como fundo à ação e à imagem desenvolvida no longa-metragem. O segundo grupo é feito de músicos que superam esta limitação, compondo peças musicais que conseguem servir ao propósito a que se destinam mas que sobrevivem à audições isoladas de seus filmes, muitas vezes ganhando vida absolutamente independente destes. Não é difícil de compreender esta característica da obra destes artistas – as trilhas sonoras, hoje, tomaram de assalto a popularidade que outrora pertenceu às composições clássicas, cujas obras contemporâneas circunscrevem seu conhecimento quase que tão somente aos especialistas do assunto. E isto deve-se, em grande parte, à este segundo grupo de compositores – muitas vezes também autores de obras clássicas/eruditas -, que tem como integrantes os músicos Zbigniew Preisner, Philip Glass e Ryuichi Sakamoto.
O britânico Michael Nyman é um dos expoentes deste grupo. Sua trilha sonora da obra-prima absoluta do cineasta britânico Peter Greenaway, “A Última Tempestade”, configura-se inteiramente neste grupo de obras. O filme encontrou sincronicidade sublime com a música do compositor Michael Nyman, habitual colaborador do cineasta, mas também conhecido pela música irretocável que compôs para filmes como “O Piano”, “Fim de Caso” e “Gattaca”. A trilha feita para o filme de Greenaway é complexisíssima, e passeia com desenvoltura por momentos de bizarrice sonora e romantismo como quem faz um “tour” do Museu de Arte contemporânea mais aguerrido ao parque arborizado e primaveril. Músicas como “Prospero’s Curse”, “History of Sycorax” e “Caliban’s Pit”, tem metais que se sobressaem em tom de urgência, com sopros breves e graves que formam temas que se repetem na melodia da música. A concepção idiossincrática destas peças sonoras servem de motivo àqueles que afirmam ser Nyman um dos representantes da música minimalista. É bem verdade que o compositor utilize-se deste recurso estilístico ao compor a melodia de alguns trechos de sua obra, mas este traço é bem mais sutil e bem menos ambicioso do que a forma como isso é explorado por Philip Glass, por exemplo – o grande representante da música minimalista nas trilhas sonoras. No entanto, apesar da beleza idílica de tais momentos da obra de Nyman, sua genialidade se sobressai mesmo na exploração da veia romântica e algo renascentista de suas composições. “Prospero’s Magic” e “Cornfield” são dois grandes exemplos da imensa beleza deste tipo de composição do músico – a primeira trazendo cordas, metais e demais instrumentos complementando-se, construindo uma melodia imponentemente regencial; a segunda desenvolvendo um explêndido tema romântico, que cresce vagarosamente e invade furtivamente os sentidos do ouvinte.
Complexo como qualquer artista que se preze, algumas das composições de Nyman para este filme de Greenaway ainda guardam algo de operístico, como podemos conferir nas faixas “Full Fathom Five”, “While you here do snoring lie”, “Where the bee sucks”, “Come unto these yellow sands” e “The Masque”: as três primeiras adornam os versos cantados pelo garoto soprano com uma orquestração sutil e reduzida; a quarta peça apresenta tom pomposo e mais notadamente derivado do estilo operístico; e a última conclui com eloqüente e variada harmonia, por vezes modificada por curvas sonoras bruscas.
No ano 2000, a Real Filarmônica Inglesa, entre tantos outros compositores regravados por ela, lançou um disco em que reinterpreta algumas peças de Nyman, entre elas algumas que compõe a trilha de “Prospero’s Books”. E é impressionante a forma como a Filârmônica concebeu um novo arranjo à canção “Cornfield” ressaltando sua beleza romântica e iluminando ainda mais sua harmonia extraordinária – impossível terminar uma audição desta versão da música sem lágrimas nos olhos e arrepios pelos corpo. Além de ter rearranjado alguns temas do filme baseado na peça de William Shakespeare – que ganham uma interpretação mais refletida, já que trabalhados por toda uma orquestra -, a Filarmônica refez outras composições famosas de Nyman, como os 4 movimentos do “The Piano Concert”, derivados da trilha do filme de Jane Campion – que foram retrabalhados anteriormente, como um concerto, pelo próprio Nyman – e ainda duas peças de outros dois filmes diferentes de Peter Greenaway; uma de “Zoo – Um Z e dois Zeros” e outra do clássico “O Cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante”. As composições ganham do filme “O Piano” ganham unidade sonora na interpretação da Real Filarmônica – tem continuidade e sonoridade homogênea, ainda que sejam, essencialmente, peças melodicamente diferentes. “Angelfish Decay”, mistura tons fugazes com momentos de contemplação, como em sua versão original, mas aqui acaba ganhando feições mais delicadas, devido à multiplicação de sua sonoridade por diversos intrumentos diferentes – é bom lembrar que a banda que acompanha Nyman tem um número reduzido de instrumentistas. E, por fim, “Miserere Paraphrase” simula, com violinos, a melodia que antes era cantado por um garoto soprano – preservando ainda muito de sua sombria idiossincrasia.
Barroca, romântica, renascentista, contemporânea, a música de Michael Nyman é tão complexa que consegue exibir facetas que se aproximam de diversos estilos artísticos ao mesmo tempo, com andamentos que vão do minimalista ao musicalmente opulento, superando com genialidade, arrojo e lirismo a limitação da “música de filme”, que muitos compositores conformam-se em compor. Nyman é dos poucos músicos que, ainda hoje, conseguem consolidar em seu trabalho uma mistura absolutamente homogênea de pós-modernidade e beleza clássica, conseguindo construir uma música que é um verdadeiro festival de sensibilidade, sem soar datada ou piegas – o que por si só, hoje em dia, já valeria a audição. Link para download depois da lista de faixas.

– Royal Philarmonic Collection:
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– Prospero’s Books:
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Madredeus – Ainda. [download: mp3]

Madredeus - AindaWin Wenders inspirou-se inteiramente na música da banda Madredeus para conceber o excelente filme “O céu de Lisboa”, uma ode à beleza do cinema e da capital portuguesa. A parceria não foi frutífera tão somente para o diretor alemão, já que Ainda é, na minha opinião, o melhor disco da banda portuguesa.
Tranbordando sensibilidade e lirismo, composto por uma sonoridade sofisticada e melancólica, o disco é um pequeno esboço da alma portuguesa, faixa a faixa. Em “Guitarra”, que abre o disco, somos remetidos aos primórdios do cantar português – as cantigas medievais -, em uma letra que declara o amor daquele povo à música popular e uma melodia que faz uso delicioso do instrumento que dá nome a canção – conhecido aqui no Brasil como “violão”. As músicas “Milagre” e “Alfama” cantam as alegrias e tristezas afetivas – a primeira bela introdução instrumental e sonoridade triste, complementada pelo canto fenomenal de Teresa Salgueiro; a segunda apresentando belíssima melodia que explora soberbamente os instrumentos de câmara e acordeão, que constroem a sonoridade básica das músicas de Madredeus. Já nas faixas “Céu da Mouraria” – com melodia delicada ornada pelo vocal nostálgico – e “O Tejo” – que inicia-se com harmonia triste, para logo iluminar-se com sutil alegria em seu refrão – constatamos o orgulho do povo português com relação à história de seu país, além da celebração das belezas lusitanas. “A cidade e os campos” versa sobre a tristeza do camponês, ao ver-se abandonado da vida rústica do campo e inserido na frieza cotidiana da metrópole – nesta faixa, enormemente melancólica, a voz de Teresa exibe dor e arrependimento ainda mais intensos. Mesmo nas faixas instrumentais, em que não temos a presença da voz exuberante da vocalista, a banda mostra conseguir cativar o ouvinte – é o que sentimos ao ouvir “Miradouro de Santa Catarina”, que consegue mesmo inspirar a visão plácida do lugar cujo nome lembra, e em “Viagens Interditas”, que guarda em sua melodia a saudade despertada pela partida.
Ao constatar a beleza da música da banda em “Ainda”, não há como não desejar conhecer o povo e a terra que inspira tamanha sensibilidade musical. Em especial para nós, brasileiros, o sentimento é ainda mais verdadeiro, já que herdamos algo desse bucolismo, placidez e nostalgia lusitanas. Mesmo para àqueles que não tem a oportunidade de fazer esta viagem literalmente, ouvir a música da banda portuguesa já confere muito das sensações que tal jornada despertaria. No entanto, muito além do sensorial, a capacidade da música de Madredeus de despertar a reflexão do ouvinte sobre o preconceito com relação à cultura portuguesa, e superá-lo, é o maior ganho de todos – e fazer isso ouvindo composições de qualidade é um prazer inegável. Baixe já o disco pelo link que segue depois da lista de faixas.

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MUSE-me, Baby!

Muse-Me, Babe!É certo que nem todo mundo está preparado para mudanças – alguns chegam mesmo a odiar qualquer tipo de investida do tipo. Atualmente, o melhor lugar para constatar isto como fato é o Orkut e suas inúmeras comunidades – basta que você escolha, por exemplo, algum artista, de qualquer meio, que tenha decidido mudar os ramos de sua carreira e suas obras. Pronto: com certeza você vai se deparar, nos fóruns das comunidades dedicadas à figura de sua escolha, com tópicos furiosos, iniciados por fãs revoltados com as mudanças. Essas, geralmente, são as postagens com as discussões que mais se prolongam, repletas de discursos contra e a favor da atitude tomada pelo ídolo da comunidade.
Obviamente, não introduzi o tópico com esta explanação gratuitamente – eu mesmo tenho minhas motivações. Fãs dos britânicos MUSE – isso se realmente algum destes estiver entre os visitante do seteventos.org – já devem saber que a banda prepara o lançamento de seu mais novo álbum, já entitulado Black Holes and Revelations, para o dia 3 de julho. E logo após do anúncio da disponibilização, via dowload pago na internet, do primeiro single do disco, a canção “Supermassive Black Hole”, o arquivo em mp3 da música já tinha vazado para sistemas de armazenamento temporários da rede. O efeito da música foi bombástico – arrisco o palpite de que, ao menos, metade dos fãs odiaram profundamente a faixa. Obviamente que se trata, justamente, das já citadas pessoas que não são exatamente defensores de mutações artísticas. Em parte, compreendo o posicionamento destes, já que motivos para tanto eles tem: a canção é, definitivamente, é MUITO diferente do que o trio britânico já fez ao longo de três álbuns lançados. No entanto, estou ao lado dos entusiastas da questão – como você pode observar pela foto acima.
O que considero fricote obssessivo-compulsivo é a atitude de alguns de, sem nem ao menos ter uma idéia do conteúdo de todas as outras faixas do disco, reprovar de pronto as mudanças – reza a lenda que a comunidade mais antiga e ativa da banda no Orkut foi simplesmente apagada pelo seu criador logo depois que este ouviu “Supermassive Black Hole” – chega a ser engraçado isso. Além deste acontecimento altamente reprovável – imagine se começassemos a tocar fogo em todos os filmes clássicos de Woody Allen por conta de seus mais recentes deslizes cinematográficos. Mesmo que se trate de um disco totalmente fora dos padrões musicais adotados pela banda até então, isto não significa demérito de qualidade, e mesmo que a perda de qualidade se confirmasse, isso não tornaria a banda desprezível – há um histórico de produção musical anterior à isto. Porém, prefiro nem me prolongar sobre este ponto da questão: qualquer pessoa minimamente esclarecida já tem isto internalizado. Acho mais relevante questionar o que há de tão ruim no medo de muitos fãs de que a banda se popularize em nosso país – coisas como clipes na MTV, músicas em rádios com audiência mais vasta, matérias em veículos abrangentes da imprensa e, inevitalvemente, fãs menos experientes declarando seu gosto pela banda. Alguém aí tem alguma dúvida que artistas como os da banda MUSE não afetariam seu trabalho por conta de uma repentina popularidade no Brasil ou qualquer outro país que, até então, não tivessem atingido? Ou alguém aí acredita mesmo que, se Absolution se tornasse popular no Brasil, o trio britânico gravaria um disco de Axé ou, na mais feliz da hipóteses, um disco de Electro-Bossa? É muito mais provável que qualquer mudança no rumo da produção seja mesmo por gosto dos próprios artistas.
Por isso, é bom controlar os ânimos e a impaciência – esperemos até o início de Julho para rechaçar ou não “Black Holes and Revalations” – até mesmo eu posso odiar o disco, por que não? Não obstante, até lá, só resta aos fãs fundamentalistas destilar seu discurso de eterna lamentação. Quanto aos mais tolerantes, arrastem os móveis da sala para os cantos e preparem o quadril: “Supermassive Black Hole” tem clara inspiração nos trabalhos mais gostosamente gingados de Prince, conseguindo ser pop – bem, algo entre o pop, o electro-funk – sem perder a elegância e intensidade já conhecidas da banda. Os fãs da banda que ainda não escutaram a música vão levar um susto: não sei onde foram parar a bateria acústica de Dominic e o baixo de Chris, mas a guitarra de Matthew está tão presente em “Supermassive Black Hole” quanto estava antes – seus acordes compõe um musicalidade diferente, mas a destreza é a mesma.
Sendo assim, deixe a intolerância um pouco de lado e aposente aqueles disquinhos chinfrins que você escuta só para tomar o embalo e cair na noite – a nova canção do MUSE faz isso por você e ainda te dá a chance de fazer um comentário super esnobe para os bárbaros ignorantes desse tipo de ambiente, do tipo, “É, o MUSE decidiu fazer isso para elevar o nível da música pop.”
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